Existem inúmeros textos, livros, mensagens que tratam sobre as disciplinas espirituais. Podemos dizer, resumidamente, que são: oração, leitura da Palavra, jejum, relacionamentos (comunhão), solitude e serviço. Outras podem ser acrescentadas a esta relação. Richard Foster, em seu livro “Celebração da disciplina” cita outras e vai muito mais a fundo no assunto, que não é o objetivo aqui. São elas que separam as crianças espirituais dos cristãos maduros, os iniciantes, dos experimentados na caminhada. Essas disciplinas não são como um toque da varinha de condão; são sacrificiais, nada fáceis, geradas em meio ao sofrimento, angústia, lágrimas. Nossa tendência natural é deixá-las de lado, cedendo ao comodismo da nossa carne ou sendo distraídos pelo dia-a-dia, trabalho, família, ativismo religioso, internet e outros cuidados, até lícitos. Muitas dessas disciplinas desenvolvemos individualmente, com lutas pessoais e joelho no chão, trancados no quarto secreto. Corporativamente, creio que temos falhado muito, especialmente no quesito relacionamento. Esse tem sido o ponto fraco das nossas igrejas atualmente, onde muitos têm se decepcionado, ficando pelo caminho desiludidos, frustrados, machucados e, pior de tudo, sozinhos.
Talvez essa seja uma das grandes crises do protestantismo histórico. Igrejas tradicionais recorrentes em programações, eventos, reuniões; desenvolvendo relacionamentos superficiais nos cultos, mais como uma demonstração de boa-educação, um papo antes de ir pra casa. Raramente, os laços de perpetuam e se transformam em cuidado duradouro. É bem verdade também que, em algumas comunidades, os grupos caseiros, células, ou como quiser chamar, têm se desenvolvido justamente na tentativa de preencher essa lacuna da grande reunião. Não acredito que tenha tido muito êxito, mesmo porque, muitas vezes, somente há repetição da liturgia dominical dentro de uma residência e os vínculos também não se estendem além. Igrejas pentecostais e neo-pentecostais mais “modernas”, não resolveram a questão, acabaram por pioras as coisas com seus ideais expansionistas, vistas ao crescimento acelerado, planejamento estratégico, de olho no “negócio”, preocupadas com a arrecadação, investimentos, som, imagem, tecnologia.... mas, e as pessoas? Quem olhará pelas pessoas que entram e saem dos
salões, com seus problemas e feridas, anonimamente, sem chamar a atenção? Não me refiro aos visitantes ou freqüentadores esporádicos, mas sim aos irmãos que estão vivendo nas comunidades sem desenvolver relações sinceras de amizade, companheirismo, compromisso, cuidado. Um corpo capenga, doente, sem forças para ir adiante tem sido a tônica de muitas igrejas, em muitos locais. Feridas abertas, não saradas, crônicas vão minando as energias do povo, levando à frustração, indiferença e ao abandono da fé, em muitos casos.
Penso que o grito de BASTA já tenha sido iniciado. Há tempos o problema foi diagnosticado, mas ainda caminhamos a passos lentos na direção da cura. Comunidades contextualizadas têm se levantado, descontentes com o estado das coisas nas denominações conhecidas, refutando o rótulo de “crente”, “gospel”, ou qualquer outro que os caracterize como extra-terrestres, chatos, xaropes e antiquados. Procuram reunir-se na simplicidade, informalidade, sem o discurso e a retórica muitas vezes vazia dos púlpitos, que toca a emoção no domingo e já cai no esquecimento logo depois do “Fantástico” (nem precisa chegar à segunda-feira). Desejam reproduzir em reuniões, geralmente pequenas, o mesmo ambiente que podem ter em casa, com a mesma liberdade, priorizando o cuidado individual. Mesmo com falhas e em meio a muitas críticas, voltam o seu foco nos relacionamentos pessoais verdadeiros, baseados na sinceridade e na exposição sem máscaras.
Não acredito que o sucesso ou fracasso nas relações entre os membros da comunidade esteja ligado ao tamanho da reunião. Mas, é bem verdade que, em um lugar menor e mais aconchegante, tudo fica mais fácil. O grande problema é que muito pouca atenção nós temos dado aos que estão próximos de nós nas igrejas e, mesmo estando firmes nelas, freqüentando as reuniões e cultos, no meio de muitos, nos deparamos com a solidão. Olhando ao redor, constatamos a ausência de alguém confiável o suficiente com quem possamos abrir o coração, nos expor, falar, deixar extravasar as decepções e o pecado que muitas vezes nos devora por dentro.
Interessante perceber a recomendação de Paulo para a vida na igreja. Poderia citar vários textos sobre o assunto, mas especialmente este me chamou a atenção, Filipenses 2:1-5:
Portanto, se há alguma exortação em Cristo, se alguma consolação de amor, se alguma comunhão do Espírito, se alguns entranháveis afetos e compaixões, completai o meu gozo, para que tenhais o mesmo modo de pensar, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, pensando a mesma coisa; nada façais por contenda ou por vanglória, mas com humildade cada um considere os outros superiores a si mesmo; não olhe cada um somente para o que é seu, mas cada qual também para o que é dos outros.
É possível notar que a plenitude do relacionamento passa pela exortação, comunhão, consolação, demonstrações de afeto, humildade, altruísmo, renúncia, sendo, todas estas manifestações, a expressão do amor de Cristo no meio do Seu Corpo.
Meu desejo sincero é que eu e você possamos encontrar pessoas ao longo do nosso caminhar com as quais possamos ser completamente verdadeiros e sinceros. Gente com quem possamos ter liberdade pra colocar o “dedo na cara” ou pra dar um beijo, pra alegrar-se ou pra chorar amargamente, pra contar uma piada ou pra confessar pecado enclausurado. Isso só será possível quando a gente se expuser sem pudor, sem medo, sem maquiagem, quando formos capazes de conhecer e sermos conhecidos por outros. Somente assim, poderemos crescer sadios, curados, sem amargura ou ressentimento, caminhando na direção do nosso Senhor. Comprometa-se a buscar, no Pai, essas ou essas pessoas e fale, se abra, converse, dialogue, viva o Evangelho daquele que foi crucificado nu, com a maior exposição de todas, pra que a gente pudesse ser e andar como igreja com uma identidade conhecida pelo mundo todo, o amor.
Por @Fabioccarvalho
Infelizmente, é triste ver nossas igrejas doentes por falta de relacionamento, sejam eles quais forem.
ResponderExcluirQue possamos amar o próximo, e buscar um relacionamento saudável.
Ótimo texto mano, Deus Abençoe!
Ótimo pontapé inicial Fábio.
ResponderExcluirRealmente, precisamos voltar ao que era a igreja em Atos, aperfeiçoar em amor nossos relacionamentos, sejam em admoestações, confissões, nas agruras ou no compartilhar das alegrias.
Deus continue te abençoando e inspirando!
Exelente o post.
ResponderExcluirA Igreja deve se preocupar mais com a pessoas,a igreja deve ser uma familia.
Vou parafrasear o Apostolo Paulo... "Posso ter tudo do mundo, mas se não tiver amor, para nada me serviria".
ResponderExcluirA igreja é um corpo, não um corpo qualquer, mais o Corpo de Cristo.
E quem é membro tem que amar o próximo como a si mesmo. Senão cumprir isso é melhor sair fora!
Existe Joio, mais também existe o Trigo. Desejo que o trigo se fortaleça mais e mais na presença de Deus.
Amém...
@PecadorConfesso